Se prestarmos atenção a um grupo qualquer de seres humanos, nos impressionamos com a diversidade de anatomias, estaturas, fisionomias e fisiologias, conformações físicas as mais variadas que, no entanto, prestam-se todas a um modo de vida comum. Mesmo entre as mais variadas culturas humanas é conservado um modo de vida que tem a ver com a história de nossa linhagem, e que nos diferencia de outros organismos. Não é isso que distingüimos quando dizemos que só o humano “tem linguagem”? Ou “tem cultura”? Ou uma existência espiritual ou simbólica? Com os organismos não-humanos ocorre o mesmo. A diversidade de formas da natureza sempre impressionou Darwin, e, em A origem, ele diz que uma compreensão abrangente da evolução passa por descobrirmos as “Leis da Variação” (DARWIN, 2002, p. 130-156).
Ao contemplar outra organização que também faz parte de nós, humanos, como a de grandes símios, identificamos rapidamente as enormes diferenças nos atributos físicos, ou, pelo menos entre “nós” e “eles” (nem todos sabemos distingüir um orangotango de um gorila, apesar de sermos mais aparentados ao gorila que o organgotango). Se atentarmos para os modos de vida que foram conservados em nossa antiga linhagem de grandes símios (que remonta a mais de 10 milhões de anos) nos impressionamos com o fato de seres tão diferentes realizarem coisas tão parecidas: a criação amorosa dos filhotes, a intricada rede social, o manuseio de alimentos e de outros objetos, a confecção (manual) deinstrumentos e muitos outros modos de conhecer, ou seja, de operar em interação com os elementos do entorno que nos permitem realizar nossa organização de grandes símios.
Como um tipo particular do modo de vida - a relação organismo-meio - temos a relação estabelecida entre dois ou mais organismos, a co-ontogenia (VIANNA, 2006, p. 308-313). Tal como em relação ao entorno, dois organismos em acoplamento estrutural irão mudar suas estruturas de modo correspondente, na interação. Se essa história de relações durar o suficiente, se a interação for recorrente e houver uma recursividade nessa interação (ou seja, se as mudanças em cada um dos organismos em interação servir para a mudanças subseqüentes nos dois sistemas) temos uma coordenação de ações ente os organismos, que é o estabelecimento de um domínio lingüístico, base da formação de um sistema social. Assim, se atentarmos, não para o “conteúdo” ou a “forma” dessas relações, para os elementos que são utilizados no proceso de interação e a maneira como são utilizados, mas prestarmos atenção na recursividade do processo interacional co-ontogênico, estaremos decrevendo os fundamentos biológicos do fenômeno da linguagem.
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